segunda-feira, 17 de maio de 2010

REPÚDIO A VEJA

O DESESPERO PARA ENTENDER O ESTRONDOSO FRACASSO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Dra., Adriana Oliveira Lima

As revistas semanais têm sistematicamente publicado artigos sobre educação tendo como foco a busca de culpados e de soluções mágicas. Se não dão a receita do “bom aluno” ou do “bom professor” procuram um culpado nas metodologias empregadas.

Ora, sem qualquer inibição todos este artigos referem-se a pesquisas mirabolantes que de fato não dizem de onde nem quem as fez (sic!). Falam de metodologias sem qualquer conhecimento mais profundo do que estão falando. Sem falar o baixo nível ao fazer analogias absolutamente impróprias para quem fala de educação (“Isto esta mais longe de Piaget do que Madona da castidade” – SIC!).

Afirmar que um mero discurso é uma prática pedagógica em nosso país é desconhecer minimamente nossa história. Em nosso país a “fazeção” de leis e as mudanças somente nos discursos é a grande realidade. Vejam que o Império foi quem mais promulgou leis para educação, entre elas a que deveria existir uma escola pública em cada província do país. Ao chegarmos a Republica nem sequer uma única escola havia sido construída. O número de teses sobre a “mania” de discurso no Brasil é enorme. Qualquer aluno sabe que nosso forte é teoria e não prática. Assim o chamado “construtivismo” não teria nenhuma chance de ser implantado no Brasil só por conta de uma avalanche discursiva.

A VEJA desta semana ensandece de horror ao suposto construtivismo implantado no Brasil. Sem falar da interpretação absurda dos princípios didáticos proferidos pelas teorias de Jean Piaget o artigo se coloca exatamente na zona do desespero de encontrar um culpado. Quando falam dos países desenvolvidos nunca falam de suas salas de aula super equipadas e muito menos dos salários dos professores.

Mas comecemos por examinar outro tipo de informação que possa ser útil para desvendar o mistério da incompetência educacional brasileira:

“Os dados fazem parte do estudo Estatísticas dos Professores no Brasil, produzido pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC), com base em dados do Censo Escolar, Censo da Educação Superior, Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad/IBGE). O texto está disponível no endereço http://www.inep.gov.br/estatisticas/professor2003/ e apresenta uma radiografia bastante ampla da situação do docente brasileiro.

O estudo mostra que um professor que atua na educação infantil ganha, em média, R$ 423. Docentes que lecionam em turmas de 1ª a 4ª série recebem R$ 462 e de 5ª a 8ª, R$ 600. Já um professor que atua no nível médio ganha, em média, R$ 866.”

(...)A remuneração de um professor do ensino médio, de R$ 866, é quase a metade do saláriode um policial civil e um quarto do que ganha um delegado de polícia no Brasil. Entre o menor salário, o de professor da educação infantil, e o de juiz, a diferença chega a ser de 20 vezes.”

(...)Nas escolas públicas brasileiras, 45% dos professores atuam em escolas sem biblioteca.

(...)A existência de laboratório de Ciências, para aulas práticas, configura-se no pior indicador de infra-estrutura. No País, 80% dos docentes trabalham em escolas que não contam com esse suporte pedagógico. Nas Regiões Norte e Nordeste, esta situação atinge 94% dos profissionais.

(...)O número de alunos por turma também é considerado elevado em todos os níveis de ensino. Na creche, por exemplo, a média é de quase 18 alunos por turma. No ensino médio é de mais de 37 sendo que mais de 20% das turmas desse nível de ensino no País possui mais de 40 alunos.

(INEP-Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira)

Devemos compreender que os dados objetivos de miseráveis salários vem desestimulando a formação de professores. Devemos lembrar que as universidades (USPs, PUCs, UNICAMP etc) vem fazendo uma formação de docentes absolutamente acadêmica onde um aluno de pedagogia sabe mais sobre a Reprodução social na educação do que um método para alfabetizar uma criança. Alunos saem das universidades cheios de teorias sociológicas e filosóficas. Mas não sabem as quatro operações ou como ensina-las as crianças. Nunca encontrei em curso algum um professor que não fosse sincero ao afirmar que a faculdade lhes ensinou somente teorias!

A formação de nosso professorado foi contaminada por um intelectualismo absurdo e sociológico, proveniente do fato de educadores verdadeiros terem perdido seus postos de comando para um “bando” de sociólogos que se apoderaram da educação e não sabem nada sobre sala de aula. Basta olharmos a formação do corpo docente das universidades, ou mesmo olharmos a formação dos chamados expoentes da educação nacional. Que são porta vozes em da educação em semanários como a VEJA.. Muito poucos são pedagogos!

A deformação da formação de educadores foi um processo muito longo, de quase 30 anos! Este é o produto que estamos colhendo. Professores sabem nomes de educadores que estão na moda acadêmica, que variou de Gramisci para Vygotsky, Perrenout e Gardner, dependendo das modas americanas e dos últimos “bestsellesrs” na França ou nos Estados Unidos, desde os anos 70. O Brasil sempre procurando uma solução mágica que dependa apenas da “caneta”, uma solução que possa aparecer por meio de um decreto, sem investimento, sem esforço, sem estudo, sem seriedade.

Nas sociedades as mudanças dependem do esforço conjunto de suas populações. Os americanos construíram a mais rica nação do mundo com muito trabalho, arando a terra, construindo estradas de ferros...o esforço americano rumo ao desenvolvimento é inegável. Assim é que se constroem nações. O Brasil precisa sair da “mania” de decreto” e partir para uma ação verdadeira no campo da educação. Precisa resgatar as boas idéias de seus educadores e reinvestir numa prática educativa efetiva. Precisa de VERBAS. Menos corrupção. Menos “achismos” jornalísticos. Mais capacitação. Mais salário e menos devaneio de que bom professor se faz só com idealismo! Mais competência na escola e menos campanhas pedindo os pais para ensinarem aos filhos. Mais sabedoria e menos modismo.

Se ninguém sabe como o construtivismo funciona, como ele estaria sendo aplicado em 60% das nossas escolas? Se fossemos até a universidade com suas modas saberíamos de onde vem e por que vem cada idéia que se diz em prática no Brasil. O fato de Piaget esta no século passado não invalida suas teoria, a menos que sejam suplantadas por um avanço científico de novas pesquisas (o que não é fato). Por este argumento teríamos que abandonar a Lei da gravidade, por exemplo, por ela ser coisa do século XVIII.... Kant estaria fora de cogitação e Aristóteles banido de qualquer estudo.

Devemos lembrar que os estudos de Jean Piaget não são métodos pedagógicos mas uma TEORIA DO CONHECIMENTO e que independe de se concordar ou não. O conhecimento se dar de uma determinada forma e cabe os educadores trazer este conhecimento para a escola, como um médico trás novas teorias e tecnologias para sua prática. Ser contra uma teoria que ajuda a compreender o conhecimento é ser obscurantista e defender o fim da infecção através da “sangria” medieval.

A síntese mal engendrada sobre o construtivismo é passível de muitas críticas, tanto da periferia do artigo de Veja mal escrito, quanto do próprio conteúdo.

Primeiro, referir-se a “um conjunto de pesquisas internacionais” sem cita-las seria inaceitável em qualquer texto que se preze e mais grave ainda no combate a alguma idéia. Neste ponto os ingleses nos ensinam um rigor fantástico.

Citar senhores das universidades com afirmações sem fundamentos e típicas de quem não leu sequer uma página da enorme obra de Jean Piaget, não torna a afirmação mais verdadeira, mas sim mais irresponsável.

Jean Piaget não entrou no Brasil pela via de textos americanos na década de 70, mas através de Lauro de Oliveira Lima, na década de 60, com a publicação do INEP, prefaciada por Anísio Teixeira, do livro de mais de 600 páginas de pesquisas pedagógica, “A Escola Secundária Moderna”. Com certeza os senhores jornalistas não conhecem esta obra (muito menos a de Piaget composta de mais de 50 volumes de pesquisas desenvolvidas em mais de 20 países por centenas de pesquisadores de diversas áreas, da lingüística à computação).

Vygotisky não é discípulo de Jean Piaget, a bem da verdade teriam feito críticas mútuas. Vygotsky adentrou nossas universidades por representar o marxismo dominante de nossas faculdades de pedagogia e não pelo valor de sua obra, pequena e pouco fértil devido sua morte prematura.

Dizer que os países de pior desempenham são os construtivistas é uma irresponsabilidade. Não existem sequer pesquisas desta natureza. Se o tradicionalismo se mantém forte na educação é por que todo processo de mudança é longo e moroso, com idas e vindas tendo que vencer as correntes do reacionarismo que deseja que as coisas fiquem imutáveis.

A falta de espírito crítico tem sido a forma mais comum da modernidade, um mergulho num certo obscurantismo. Não existem canais de debate, não existem formas de discussão pública. Os meios de comunicação estão mais ou menos prisioneiros de seus “achismos” entricheirados em opiniões sem discussão. A TV , por exemplo, faz um programa de humor em cima de sua prórpia novela, sem se dar conta do absurdo sociológico e sem que ninguém encontre o caminho onde se discutir tais abusos de poder.

A “desconstrução do construtivismo” feita delo jornalista não é merecedora de análise, vez que é tão leiga, tão sem fundamento, que seria longo demais explicar, o que sairia do propósitro deste artigo, mas, sobre isto temos já uma rica literatura.

Vamos CONSTRUIR um CONSTRUTIVISMO sério e competente. Vamos estudar mais, pesquisar mais. O Brasil não precisa de polêmicas de posturas falsas ou verdadeiras. Nosso país precisa investir mais na educação. Os professores precisam melhorar sua situação financeira e cultural. As universidades precisam de programas mais objetivos. Os pais precisam participar mais da educação dos filhos.

3 comentários:

Unknown disse...

Ler esses artigos irresponsáveis, sem nenhuma fundamentação pedagógica, E mais. Perceber pais e professores influenciados pela infeliz matéria, me decepciona. Mas isso faz parte do processo histórico que vivemos.Porém, ler as colocações profundas e fundamentadas de uma pessoa renomada e coerente, vinda e conhecedora do que se diz e faz. Nos incentiva na luta pela erradicação da ignorância, pois esses artigos nada mais são palavras de leigos sobre nossa história educacional. Obrigada Adriana, por continuar intervindo para o crescimento das mentes humanas. Precisamos mostrar para esses medíocres jornalistas (capitalistas) como desenvolver uma abetura das mentes para¨"todos os possíveis"...

Unknown disse...

Não é a primeira vez que esta repugnante revistinha tece análises irresponsáveis sobre a situação da educação no Brasil. Como me recuso a comprar ou a ler esta revistinha recebo informações de meus colegas. A análise que eles se propõem a fazer parte do princípio de que determinada metodologia já tenha sido implantada na educação brasileira, quando ela só é implantada em algumas escolas particulares, para a classe média. E isto, mesmo depois de Lauro de Oliveira Lima ter iniciado sua ação nos anos 50, na Escola Agapito dos Santos, em Fortaleza. A prática (enfatize-se a palavra prática) de Piaget, Paulo Freire, entre outros ainda não foi descoberta no Brasil. Como pode esta revistinha criticar um método que ainda não foi implantado no Brasil de forma sistêmica? É por essas, e muitas outras, que eu me recuso a ler esse pasquim.

José Luiz Bello
Pedagogo

Di Biase disse...

Parabéns Adriana

Raramente vemos nas postagens da web ou na mídia em geral um artigo tão lúcido sobre Educação no Brasil.

Francisco Di Biase (discípulo intelectual e amigo do Lauro)